O acúmulo de tarefas e a autocobrança podem prejudicar a saúde física e mental.
Por Stephany Mariano
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Acordar cedo para estudar, trabalhar, participar de projetos, cursos, palestras, manter a agenda cheia. Essa tem sido a rotina de muitas pessoas. Uma necessidade constante de produzir, em muitos casos sem pausas, e o acúmulo de tarefas têm contribuído para o desenvolvimento do que os especialistas chamam de produtividade tóxica. Mas o que seria esse fenômeno?
O termo tem sido utilizado para se referir a uma rotina não saudável, com o potencial de trazer prejuízos às pessoas que têm enfrentado esse problema. A palavra tóxica ganhou destaque com seu uso em outras situações que trazem uma ideia similar. Esse tipo de produtividade está ligada à ideia de que o valor do indivíduo depende e/ou é definido pelo o que ele produz.
Como em vários outros aspectos da vida, esse problema foi potencializado por conta da pandemia. O isolamento social obrigou as pessoas a ficarem em casa, isso fez com que suas rotinas de estudo e trabalho, por exemplo, fossem realizadas da porta para dentro. Nesse novo cenário, que já não é tão novo assim, o ensino remoto e o home office dominaram a vida das pessoas ao redor do mundo, trazendo novas possibilidades e inovações, mas que ao mesmo tempo tem trazido também pontos negativos significativos. Com o ambiente profissional, pessoal e educacional combinados em um só cômodo, tornou-se cada vez mais difícil impor limite entre essas atividades, culminando em um acúmulo de tarefas.
Rotinas exaustivas
Beatriz Garcia, ora tem algumas horas de estudo, ora passa o dia inteiro fazendo as coisas da faculdade. A estudante no último período de Enfermagem da UFF conta que, por achar que não tinha muito o que fazer, acabou acrescentando atividades demais e sente que não consegue mais alcançar todas elas. “Tá tudo muito confuso. Eu vou começar uma coisa e aí, quando eu vejo, eu já tô fazendo umas 3 atividades juntas, e no fim do dia eu não consegui completar nenhuma”. Por conta disso, a jovem de 24 anos afirma se sentir em um estado de cobrança constante, que quase sempre acaba em frustração. “Se eu não pegar coisas pra fazer eu me sinto inútil e se eu pegar muitas coisas eu me sinto inútil também, porque eu não consigo dar conta do que eu planejei fazer”.
A estudante afirma que a autocobrança fala mais alto e que as redes sociais contribuem muito para a pressão que coloca em si mesma, devido à comparação de seus resultados com o de outras pessoas. O mesmo acontece com Yuri Banov, estudante de psicologia da UFF. Além dessa comparação, percebeu que havia algo de errado com sua rotina por conta da dificuldade de realizar tarefas simples devido ao esgotamento. “Fazer um parágrafo de um texto, escrever alguma coisa, eu percebi que não estava rolando, sabe?”.
Yuri diz sentir dificuldade em definir o momento de cumprir suas tarefas e de descansar, fazendo com que esqueça de pensar em si mesmo. “Quando chegou a pandemia, o lugar de lazer era o mesmo lugar onde eu estudava e aí essas coisas se engrenaram junto”. Por conta disso, ele precisou estabelecer um limite de horário para tentar não passar tempo demais só produzindo. “Você vai emendando uma tarefa na outra. Quando é que você vai pensar em você mesmo?”
Combatendo o inimigo
Mas como identificar o problema? Brenda Vanin, psicóloga clínica especialista em psicologia, avaliação e atenção à saúde diz que uma rotina pode se tornar tóxica quando esquecemos de incluir o descanso como uma de nossas prioridades. “ O descanso faz parte do ciclo da produtividade, nós não somos máquinas, nós não somos como os computadores, os robôs, que podem fazer aquilo de forma ininterrupta”. Ela ainda reforça que é preciso compreender e respeitar o próprio limite, pois esse seria um dos motivos pelos quais a produtividade que seria normal se torna tóxica.
Um estudo realizado pela Chegg.org, ouviu estudantes universitários em 21 países e o Brasil obteve o maior índice de universitários que declararam ter a saúde mental afetada na pandemia, com 87% dos entrevistados afirmando que houve aumento de estresse e ansiedade. A produtividade tóxica é um dos fatores que podem afetar diretamente a saúde mental dos indivíduos, gerando transtornos de ansiedade, depressão e a síndrome de burnout. "A síndrome de burnout tem a ver com o esgotamento que é causado pelo ambiente de trabalho ou de estudo, então um estudante universitário ou até um estudante que ainda está na escola pode acabar desenvolvendo o burnout", explica a psicóloga.
Brenda reforça que buscar fontes de lazer e atividade física. Pausas e o apoio de amigos e familiares são importantes para amenizar a situação, mas também é preciso compreender que nem sempre o indivíduo conseguirá resolver a questão sozinho. Neste caso é recomendado buscar ajuda. “Você, junto com o profissional, vai descobrir qual é a melhor forma de lidar com essa situação, qual é o seu contexto específico, como vocês podem desenvolver estratégias novas e o que funciona para o seu caso”, finaliza.