Por Mariana Pitasse
Não foi assim logo de cara. Claro que eu já havia reparado alguns indícios, mas só fui perceber que meu amigo era um completo egoísta em uma conversa rotineira, depois do almoço. Em meio a umas observações sobre minha viagem a Montevidéu, disse que não havia encontrado mendigos, pelo fato de ter me hospedado com a parcela bem nascida da cidade uruguaia. A primeira reação de meu amigo ao escutar minha fala foi uma torcida de nariz, seguida por uma exclamação: por que eu viajaria para ver pessoas pobres? É realmente bom que não tenha visto!
Deixei passar.
Começamos então a conversar a respeito dos meus anseios sobre a faculdade de Jornalismo. Meu incômodo com o caráter meramente tecnicista que os estudantes estão incorporando com tanta naturalidade, não foi compartilhado por meu amigo. Eu podia ver em seu rosto. Quando comecei a falar mal do jornalismo feito pela Folha de S. Paulo, então, ele quase pulou da cadeira.
Em resposta às minhas divagações vieram sucessivos socos no estômago. Ele me disse que achava ótimo o fato da universidade só formar para o mercado. Que a teoria não tinha valor algum na prática e que ficaria muito feliz de ser jornalista da Folha produzindo o que lhe fosse estipulado, sem pestanejar, se ganhasse um bom salário para sustentar sua vida confortável. Por fim, assumiu com naturalidade: sim! Sou egoísta!
Em um primeiro momento, me preparei para assimilar toda aquela informação e desenvolver uma argumentação contrária. Saqueada pela angústia, pensei: quanta insensibilidade! Em seguida, comecei a sentir admiração pela sua sinceridade. Meu amigo era, sim, um egoísta, mas não um egoísta disfarçado de preceitos politicamente corretos.
Com fôlego recuperado, rebati dizendo que o espaço universitário teria que ser o lugar dos pensamentos efervescentes, das tentativas, do conhecimento. Que o estímulo à competição e a simulação da vida no mercado de trabalho não seriam os melhores caminhos. Ele me olhou, posou sua mão em meu ombro e disse com um sorriso: você é mesmo uma romântica.
E talvez eu seja mesmo.
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