Por Bruno Roncada, Lucas Bueno, Jefferson Júnior e Matheus Lopes
Dono de uma trajetória mais do que centenária, o remo brasileiro vive capítulos que não condizem com sua história. Os problemas enfrentados não são novos. Reclamações a respeito da estrutura e da falta de organização do esporte são recorrentes. Os já longínquos anos de ouro, ainda na primeira metade do último século, parecem ainda mais distantes. Uma nova chance surge com a chegada dos Jogos Olímpicos à cidade do Rio de Janeiro, daqui a três anos. Mas a esperança vira medo, quando se olha para trás e se pensa na herança deixada pelo Pan-americano de 2007.
O remo surgiu oficialmente no Brasil na última década do século XIX. A Federação de Remo do Estado do Rio de Janeiro, que precede a Confederação Brasileira e que já teve diferentes nomes, foi criada em 1895. Na mesma década, surgiram os três clubes cariocas que historicamente mais se destacaram no esporte: o Clube de Regatas do Flamengo, o Club de Regatas Vasco da Gama e o Botafogo de Futebol e Regatas. Mesmo sendo reconhecidos mais pelas suas trajetórias nos campos de futebol, os três gigantes não levam o termo “regatas” em seus nomes à toa. Vasco e Flamengo têm juntos nada menos do que 93 títulos estaduais. Fato ainda mais relevante se lembrarmos que o estado do Rio de Janeiro é tradicionalmente considerado o mais forte do Brasil no remo. Na conta, os rubro-negros levam vantagem sobre os vascaínos, com um título a mais: 47 a 46. O Botafogo também tem destaque. O clube alvinegro é tetracampeão estadual e teve um excelente início de campeonato neste ano, vencendo duas das três regatas disputadas até agora. As chances de quebra de um tabu que já dura 49 anos são bastante consideráveis.
Ao lado do Botafogo, outros três times já conquistaram o título do Campeonato Estadual do Rio de Janeiro em quatro ocasiões: o Boqueirão do Passeio, o Gragoatá e o Santa Luzia. Guanabara, por três vezes, e Internacional e São Cristóvão, com um título cada, fecham a lista de vencedores do torneio. Os clubes, ou grupos de regatas, como eram conhecidos, trazem à tona a história geográfica do remo no Rio de Janeiro. A princípio, o esporte se instalou na zona portuária da cidade, nas regiões de São Cristóvão, Saúde e Gamboa. Aos poucos, foi chegando à zona sul, agregando a região do Flamengo e de Botafogo. Lá foi construído o Pavilhão de Regatas, casa do esporte nas primeiras décadas do século XX. O remo faria, então, em 1927, sua transferência para a Lagoa Rodrigo Freitas, local onde permanece até hoje. O esporte já é, portanto, parte de uma das mais belas paisagens da cidade do Rio de Janeiro.
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Ouça aqui trechos das entrevistas:
- Marcelo dos Santos, coordenador técnico do Vasco, conta sobre as dificuldades que os clubes enfrentam devido aos altos custos do remo.
- Edson Figueiredo, diretor técnico do Flamengo, explica as dificuldades que os clubes têm de investir em jovens de comunidades carentes.
- Guilherme Gomes, atleta de remo do Botafogo, conta que a estrutura do esporte ainda tem muito a melhorar.
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Mas neste cenário nem tudo é perfeito. Apesar da beleza incontestável, a Lagoa têm problemas que atrapalham o melhor desempenho dos atletas do remo. Os esportistas dividem espaço com lanchas e jet-skis, que causam marolas nas águas. A prática do esporte fica, então, comprometida. “Aqui a gente não consegue ter uma qualidade de treino boa”, afirma Alexandre Monteiro, técnico do Botafogo. Alexandre sugere que poderiam ser estipulados horários para a prática do remo e para o uso de lanchas e jet-skis. Mas o próprio técnico acredita que, para resolver mesmo o problema, “o remo deveria ter uma sede para treinamento mais adequada”.
O presidente da Federação de Remo do Estado do Rio de Janeiro (Frerj), Paulo Roberto de Carvalho concorda que a Lagoa tem problemas. “Estamos buscando no COB, que já sinalizou que vai nos apoiar, para pedirmos um Centro de Treinamento”, afirma. O CT, no entanto, ainda seria construído na Lagoa e poderia ser dividido com a canoagem. O próprio presidente reconhece que essa não seria a melhor opção e diz que o melhor seria que remo e canoagem se unissem em busca de mais um espaço.
Enquanto o CT não sai, os clubes vão tentando se organizar de maneira isolada. O Flamengo, que tem sua sede na Lagoa, pretende construir ali um centro de excelência de remo mundial, com a ajuda de investidores. “Não tem investimento do COB, não tem investimento do governo, não tem nada”, afirma o diretor técnico do Flamengo, Edson Figueiredo. “O Flamengo está se mexendo sozinho”, finaliza.
Outro problema bastante mencionado pelos profissionais do esporte são os altos custos do esporte. O coordenador técnico do Vasco, Marcelo Neves dos Santos, cita o exemplo do remoergômetro, aparelho que simula a prática do remo. O Brasil não tem fabricantes do produto, que precisa ser então importado. As altas taxas de importação tornam o produto muito caro. Os clubes, por sua vez, têm dificuldades para arcar com os preços elevados. O problema também se repete na compra de barcos e remos. “Há uma imensa boa vontade dos clubes para fazer o esporte chamado amador. Mas acontece que as dificuldades são muito grandes”, explica o comandante vascaíno. “O nosso esporte é muito caro. Os barcos e remos são importados e a gente não tem nenhum tipo de incentivo”, completa.
Os altos investimentos são fatores determinantes para a dificuldade de popularização do esporte. Na tentativa de atrair jovens, clubes como o Flamengo formam parcerias com escolas particulares e públicas. Da mesma forma, Vasco e Botafogo também oferecem ajuda de custo a seus atletas. Ainda assim, viver do remo pode ser complicado, principalmente para os demais profissionais “Dá pra sobreviver? Dá, mas não é fácil. É complicado e a gente tem sempre que procurar alguma coisa a mais para se virar”, conta Monteiro, técnico do Botafogo, que durante parte de sua carreira trabalhou paralelamente no mercado financeiro.
Atrair o jovem de comunidades carentes é uma opção. O técnico do Vasco conta que no clube existem exemplos de garotos que saíram de favelas e que hoje estão praticando o remo. A dificuldade de investimento, no entanto, pode dificultar ações desse tipo. Como salienta o diretor técnico do Flamengo, o clube tem que investir em áreas como transporte e alimentação para ajudar estes atletas em situações financeiras mais complicadas. Isso acaba se tornando uma aposta de risco para a instituição, que muitas vezes acaba preferindo jovens de classes mais altas, que ainda têm, segundo ele, um biotipo mais compatível com a prática do remo. “Entre apostar no biotipo longilíneo, loiro, alto, forte e um pequeninho desses (meninos dos projetos sociais do Flamengo), infelizmente eu vou investir no loiro, alto e forte”, afirma o diretor.
Um dos projetos da Federação de Remo do Estado do Rio de Janeiro é interiorizar o esporte para atrair mais garotos, não ficando apenas na Lagoa. “Nosso objetivo é levar o remo seja para o local que tenha a lagoa ou não, para o garoto conhecer o esporte”, conta o presidente Paulo de Carvalho.
Confira a galeria de fotos:
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