Caio Renan / Júlia Ferraro
No livro 1984, de George Orwell, a frase "Big Brother is Watching you" se tornou famosa referência a tentativas de vigilância excessiva de autoridades. Atualmente, nos tempos de efervescência digital, Orwell poderia dizer que sua obra se baseia em fatos. As revelações feitas por Edward Snowden, ex funcionário da NSA e da CIA, colocaram em xeque a privacidade de todos os cidadãos do mundo que utilizam a internet.
Snowden revelou detalhes da vigilância de comunicações e tráfego de informações executada pelo programa de vigilância PRISM dos Estados Unidos, confirmando o que já diziam Julian Assange e os Cypherpunks. Assim como quando o soldado Bradley Manning revelou informações de ilegalidades cometidas pelas tropas americanas no Iraque, Snowden passou a ser perseguido pelo governo dos EUA pela divulgação de informações sigilosas.
As revelações de Snowden, em um tempo em que basicamente tudo pode ser feito pela internet, sacodem (ou deveriam sacudir) o mundo. Os índices de uso de tablets, smartphones e computadores só aumenta. As redes 3g e 4g se expandem, incluindo cada vez mais pessoas ao ambiente online. Com bilhões de pessoas realizando suas tarefas e desenvolvendo partes de sua vida via internet, como desassociar o direito inalienável à privacidade da espionagem desmedida do governo e das corporações americanas?
Uma reflexão deve ser feita: a grande maioria dos dados são fornecidas por nós mesmos, os usuários. Não há hoje muita gente que não use nenhum serviço gerido pelas corporações Google, Microsoft ou Facebook. E essas empresas, como bem lembra o cyberativista Jeremie Zimmerman, sabem tudo sobre nós. "É só olhar o Google. O Google sabe, se você é um usuário padrão do Google, o Google sabe com quem você se comunica, quem você conhece, o que você pesquisa, potencialmente sua orientação sexual, sua religião e pensamento filosófico mais que sua mãe e talvez mais que você mesmo". Sobre o Facebook, Zimmerman atenta para o comportamento atual dos usuários na internet, que facilita muito a falta de privacidade. O ativista diz que os usuários demonstram satisfação em entregar dados pessoais, como fotos, locais que frequentam, pessoas com as quais convivem, e isso tudo sem ter a real dimensão de como isso pode ser usado, em meio a interesses financeiros, pela personalização da publicidade, ou até mesmo do armazenamento de dados da vida pessoal dos usuários que podem ser usados contra si em um futuro distante.
A internet surgiu como um novo tipo de mundo. Um mundo livre, onde cada um teria seus direitos à liberdade e privacidade. Hoje, dada a dimensão tomada, a internet é mais um ambiente de guerra entre governos. Há espionagem, ataques digitais, roubos, entre outras coisas. Em um mundo suspenso em que a cada segundo informações são compartilhadas, geradas e modificadas através de caminhos cada vez mais complexos e secretos, a segurança é uma função que cresce lentamente. Novas possibilidades surgem, assim como maneiras de se aproveitar destas, muitas vezes de forma ilegal, como é o caso da utilização dos dados pessoais. Porém, para esse novo mundo, que parece intocável, as leis terrenas mal se aplicam e quando sim, são destinadas a grandes escândalos de interesse de poucos. Os mesmos que deveriam ser os punidos pela manipulação de informações privadas. Cuidado, você está sendo observado. E não só observado: analisado, previsto e instrumentalizado para, futuramente, gerar um retorno positivo para as grandes corporações. E enquanto isso ocorrer de maneira praticamente invisível, a vontade do usuário em participar não é um dado relevante.
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