Por Daniela Reis e Luiza Gould
Assim que a pedagoga Martha Miranda recebeu a equipe de reportagem, duas cachorras pequenas e agitadas correram na nossa direção abanando os rabinhos. O hall de entrada é aconchegante: diversas plantas e um singelo banco recebem os visitantes. Martha sentou no sofá da sala, cruzou as pernas e com os olhos nostálgicos começou a relembrar as memórias que evolviam aquele lugar. Uma casa à moda antiga no Ingá com pé direito alto – que é a distância do pavimento ao teto – porão e assoalho barulhento.
O pai de Martha comprou a moradia antes de a filha completar seu primeiro ano de vida. Por lá viveram mesmo após a morte do pai, em 1959. A mãe então passou a ser a chefe da família: terminou de pagar as parcelas da casa e criou Martha e seu irmão.
A infância foi vivida no meio da rua com os amigos da vizinhança. Quem olha as calçadas apertadas pelos carros estacionados e os pedestres que se espremem para passar, nem imagina que a rua era lugar das crianças pularem amarelinha. Martha lembra que o quintal também era um espaço bastante aproveitado pelos pequenos.
Se por um lado, o dia a dia não tinha tantas facilidades tecnológicas quanto hoje, por outro as pessoas eram mais próximas e confiavam umas nas outras. “Todo mundo se conhecia, se dava bem. Era a vida mais calma.” Recentemente, o aumento da violência em Niterói tem assustado os moradores, o que contrasta brutalmente com as lembranças de Martha de décadas atrás: “Em casa não se fechava o portão, só à noite, na hora de dormir”.
A família só saiu de lá quase duas décadas depois para morar em um apartamento em Icaraí, onde já viviam outros parentes. A experiência fez Martha perceber que não gosta de morar em prédio. O barulho das crianças vizinhas e a falta de privacidade incomodavam. Nove anos depois, quando estava prestes a se casar, ela decidiu voltar para o antigo lar. Antes, porém, resolveram fazer uma reforma. “Era pra ser só uma reforma simples, mas as paredes caíram... Já que acabou tudo vamos fazer uma nova!”, ela sugeriu. E foi assim que a sala ganhou mais janelas e uma parte da varanda se transformou em uma garagem.
*Vídeo produzido por Igor Pinheiro
O marido, José Luiz Paulo da Silva, também gosta muito do lugar. Ele trabalhava por perto e todo dia passava na frente da casa antes de conhecer Martha. Ele costuma dizer que nunca poderia imaginar que moraria lá um dia. Ao que a esposa reponde com a seguinte frase: “É Zé, quem podia imaginar... O mundo dá voltas.”
Quando uma das repórteres afirmou que algum dia ainda compraria uma casa, Martha aconselhou: “Eu acho muito bonito você botar uma meta na sua vida. Olha, tudo que você fala e se programa você consegue. Pode demorar um pouco, mas consegue. É só botar fé”.
Além da saudade permaneceram em Martha algumas imagens de um passado inteiro vivido naquele espaço: a festa dos 15 anos; os amigos indo para o carnaval; o desenho a carvão feito por um amigo do irmão na parede do quarto e ela mesma saindo pelo portão vestida de noiva. E é por esse mesmo portão que passou esta equipe de reportagem ao se despedir de Martha. Carregando um depoimento emocionante de quem viu a cidade se transformar através das janelas de uma casa antiga.
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