Por Débora Diettrich, Liliana Silva e Marcela Rochetti
O Casarão: Como surgiu a sua relação com o Haiti?
Bruna Cysneiros: A minha primeira relação com o Haiti surgiu em 2009, quando meu pai Tenente Coronel do Exército, foi convidado pela ONU para participar da missão de estabilização no Haiti (MINUSTAH). Meu pai construiu, em sua estadia no Haiti, uma relação de amor por aquele país. Em todos os encontros que tivemos, telefonemas e e-mails, ele mencionava o quanto aquele lugar e pessoas o impressionavam. A partir dele comecei a criar um carinho especial pelo país, e passei a entender melhor as questões enfrentadas por aquela nação.
Em 12 de Janeiro de 2010, faltando poucos dias para o retorno definitivo do meu pai, recebemos a notícia do terremoto que havia acontecido na capital Porto Príncipe. E uma semana após a tragédia, recebemos uma nova notícia, a de que o corpo do meu pai havia sido encontrado em meio aos escombros.
Quando tudo aconteceu, acreditei que jamais poderia ouvir o nome daquele país novamente, no entanto, a semente já havia sido plantada. Um mês depois do terremoto, eu e minha família já começamos as primeiras mobilizações na tentativa de dar uma certa continuidade ao trabalho do meu pai.
OC: Quem teve a ideia de construir uma biblioteca em Porto Principe? Como ela surgiu? Qual era o objetivo pensado na época?
BC: Todo o projeto foi pensado pela minha família, a partir da figura do meu pai, o maior amante da leitura que já conheci. Depois de muitas arrecadações de bens não duráveis, começamos a pensar em algo que fosse mais definitivo, que deixasse o sobrenome de nossa família enraizado naquele lugar tão significativo para todos nós.
Unimos a nossa vontade a um dos maiores prazeres do meu pai, o que resultou na biblioteca.
OC: Você já foi à Porto Príncipe, ou outra cidade do Haiti?
BC: Devido a minha forte ligação com meu pai e a tragédia de sua perda, infelizmente ainda não consegui forças para essa viagem. No entanto, tenho certeza de que em futuro próximo visitarei o país. Aliás, trabalharei todo o meu projeto de conclusão de curso com base em informações colhidas no Haiti e pretendo viajar para lá o mais rápido possível.
OC: Estando de longe, como foi esse processo? Da ideia até a construção? Ela já está pronta?
BC: Foi um processo longo, e sem a ajuda de inúmeras pessoas jamais teríamos conseguido. Começamos a arrecadar livros de amigos próximos, e fizemos uma espécie de corrente, pedindo livros através das redes sociais. Com a ajuda do Corujão da Poesia, a arrecadação de livros se tornou muito mais fácil.
A biblioteca foi inaugurada no último 16 de setembro, e está localizada na escola Mixte Terre Promise em Porto Príncipe,. Ela recebeu o nome de Coronel Cysneiros, em homenagem ao meu pai.
OC: Quais são suas funções nesse projeto?
BC: Como esse foi um projeto familiar, as funções foram divididas conforme a demanda. Participei da arrecadação de livros, divulgação, formulação de perguntas para um quiz solidário, compra de materiais, escolha dos móveis para biblioteca... E outras diversas pequenas funções que surgiram ao longo do caminho.
OC: Como foi a campanha para arrecadar ajuda (dinheiro, livro)? O que vocês conseguiram arrecadar até hoje?
BC: Recebemos muita ajuda de amigos e conhecidos. Montamos um quiz, todo dinheiro arrecadado era convertido para as compras necessárias para a nossa biblioteca. Contamos com a ajuda da Aliança Francesa e do Corujão da Poesia na doação de livros, e de muitas outras pessoas empolgadas com a iniciativa. Como desde 2010 já arrecadamos comida, cloro para purificação de água, máquinas para corte de cabelo, muitas pessoas já estavam envolvidas nessa missão. Então, quando demos início ao projeto da biblioteca, essas pessoas que já nos ajudavam passaram a divulgar e a trabalhar conosco. Arrecadamos para a biblioteca cerca de dois mil livros. E compramos com o dinheiro arrecadado estantes, mesas e cadeiras.
Como a biblioteca foi montada dentro de uma escola, conseguimos com apoio da Aliança Francesa de Niterói, imprimir 730 livros: "Meu herói da paz", titulo do livro infantil que conta a história do meu pai, traduzidos para o francês, para serem entregues para cada criança na inauguração da biblioteca.
OC: Quem leva o material para o Haiti?
BC: Todo o material arrecadado, incluindo livros e mobília, foi enviado pelos aviões da FAB, aos cuidados do Brabatt (Batalhão do Exército Brasileiro no Haiti).
OC: Quais foram os meios (redes sociais, site, blog) que você usou para divulgar essa campanha?
BC: Nosso grande avanço nas arrecadações aconteceu através do Corujão da Poesia, onde criamos campanhas no facebook. Conseguimos aparecer em jornais, revistas e televisão.
Não contamos com nenhuma ferramenta específica, divulgamos de todas as formas que podíamos. Pedimos sempre para quem não pudesse ajudar com material, que nos ajudasse a compartilhar o projeto.
OC: Você ficou surpresa com toda a ajuda que conseguiu?
BC: Muito. A campanha de arrecadação de livros tomou proporções imensas, e as pessoas se mobilizaram de uma forma muito comovente. Ver nossa biblioteca aparecendo em programas de TV e jornais, realmente nos surpreendeu.
OC: O que mais te marcou e/ou te emocionou durante essa experiência?
BC: A chance de levar a história do meu pai adiante. A certeza que sua mensagem de solidariedade e de amor ao próximo está sendo passada, com certeza foi o meu maior incentivador e o que mais me emocionou durante essa jornada.
OC: A construção da biblioteca mudou alguma coisa em você?
BC: Com certeza. Ver uma mobilização tão grande, muitas vezes de pessoas desconhecidas, me fez reavaliar muitas coisas, e ter mais fé nas pessoas.
OC: Quais são planos agora?
BC: Meu próximo passo agora é conhecer pessoalmente a biblioteca, as crianças dessa escola e ver de fato que impacto essa biblioteca causou neles. Acredito que após essa experiência, novos projetos comecem a surgir.
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