Por Gustavo Cunha
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O carnaval do ano passado foi decisivo para Pedro Garcia. Fantasiado de Jorge Thadeu (fotógrafo mulherengo interpretado por Fábio Jr. na novela ‘Pedra Sobre Pedra’, em 1992), o carioca saiu às ruas com uma pequena câmera analógica à mão. Entre confetes e serpentinas, clicou – sem muita pretensão – a farra da cidade sobre o asfalto do Humaitá, no bloco infantil Cordão Umbilical. Na andança animada pela cantoria de marchinhas conhecidas, uma cena, em especial, chamou a atenção do publicitário: com os olhares vagos, convergidos para uma mesma infinitude, cinco crianças amarelavam a boca, calmas, cada qual com um picolé de manga. "Foi uma epifania carnavelesca", classifica Pedro, que – um pouco mais tarde – viu surgir daquele insight o projeto Cartiê Bressão, uma brincadeira criada no Facebook e no Tumblr com o cultuado fotógrafo francês Henri Cartier-Bresson (1908 - 2004). Num bom carioquês, a "sacada" foi decisiva.
"Continuei fazendo fotos depois do Carnaval, com o celular mesmo. Fotografei um homem pulando na rua que me fez lembrar uma imagem clássica feita pelo Cartier-Bresson, de um sujeito saltando uma poça. Depois, foi a foto do vendedor de milho, na Praia do Arpoardor [que ilustra a página no Facebook]. Comecei a perceber que havia uma unidade no que eu estava fazendo. Juntei as minhas preferidas e fiz um Tumblr. E aí que pensei no nome", conta Pedro, que enxergou semelhanças entre os instantes decisivos de Bresson e os cliques disparados de seu iPhone. Escritas num francês para lá de cariocado, as legendas dão o tom final – e humorado – às imagens. Sem pudores, Pedro logo revela: "Sempre uso o Google Tradutor. Falo o francês bem básico, daquele aprendido em livrinhos com fita cassete".
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O sucesso da versão tupiniquim-bressoniana foi tão grande pelo mundo virtual (a página no Facebook beira os 30 mil seguidores) que o projeto ganhou versão impressa, em livro (Versal Editores, 80 págs., R$ 50) – num movimento talvez inusitado para os dias de hoje. "Comecei vendendo os prints [impressões de algumas fotos], pois muita gente dizia que queria pendurar as imagens em quadros, na parede de casa. Depois, muitos começaram a dizer que queriam um livro, para guardar todas as fotos", explica. Não foi à toa, portanto, que o projeto teve como financiador o próprio público – que fez "vaquinha" pela internet, num site de crowdfunding. (Vale lembrar que Pedro é um dos fundadores do Queremos).
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As imagens aparecem para o rapaz de 33 anos quando ele está no ônibus, na rua, no táxi, caminhando para o trabalho. "Não saio exclusivamente para fazer fotos. As cenas aparecem para mim quando estou na minha rotina do dia-a-dia. Basta sacar o iPhone do bolso e fotografar", conta. Assim foi quando viu uma menina com os cabelos vermelhos-giz-de-cera parada na seção de laticínios de um mercado, com um pacote de fraldas na mão. Gostou da composição, da luz, das cores, e perguntou, sem grandes receios: "Posso?". Ela logo topou. "Quase todo mundo gosta de ser fotografado. As pessoas gostam de saber que tem gente interessada nelas", diz. Numa dessas, chegou a ser reconhecido, quando pediu para eternizar um folião fantasiado de camisa do Che Guevara (apenas a foto abaixo explica), na passagem que a Orquestra Voadora fez pelo Aterro do Flamengo, no Carnaval deste ano. "É você que é o Cartiê Bressão?! Sou um mega fã!", exclamou, entusiasmado, o fotografado – ao ouvir a identificação de seu interlocutor. "Muitos ficam impressionados quando descobrem que o Cartiê Bressão sou eu. As pessoas acham que quem faz as fotos e alimenta a página é mesmo um velhinho barrigudo francês", declara, entre risos.
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Alguns dos fotografados estiveram, no início do mês, no lançamento do livro – inclusive a mocinha dos iogurtes. "Foi um trabalho de detetive conseguir a autorização de imagem dessas pessoas. Tive que ir perguntando para um, para outro, mostrando as fotos, para achá-las", revela. O resultado não podia ser outro: agradou gregos e troianos, fotógrafo e fotografados. "Fico muito feliz de ter conseguido algo que dá retorno. Qualquer trabalho que se sustente é uma garantia de longevidade", comemora.
Pelas redes sociais, Pedro continua a alimentar com poesia os seus seguidores. No caos do último temporal, que destruiu parte da cidade – deixando muitos desabrigados –, quem abriu a página do publicitário no celular teve, ao menos, um minuto de riso:
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