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Debate põe em xeque o machismo das torcidas universitárias

Por Gustavo Xavier, Marcos Kalil e Rafael Bolsoni Bastos

[caption id="attachment_5039" align="aligncenter" width="470"]DSC07854 Representantes da Atlética de Direito da UFF participam do debate (foto: Fabio Peixoto)[/caption]

O Centro Acadêmico Evaristo da Veiga, diretório de Direito da UFF, realizou na quinta-feira (22) a “Roda de Debates: Rivalidade nos Jogos Universitários”, com o intuito de discutir as práticas das torcidas universitárias nas competições. O evento comprovou a necessidade da abertura de mais espaços de discussão acerca de temas como a sexualidade, a liberdade sexual e as representações de gênero na sociedade.


A iniciativa ocorreu após a repercussão dos casos de machismo e misoginia na preparação para os Jogos Jurídicos e durante o JUCS, torneio de Comunicação Social. No início do mês de maio, o Coletivo de Mulheres da UFRJ denunciou uma ilustração publicada em um evento do Facebook, organizado pela Atlética de Direito da UERJ. O convite para a próxima edição da disputa entre universidades da área continha a ilustração de uma mulher, em referência à rival UFRJ, praticando sexo oral forçado em um coiote, mascote da entidade esportiva da instituição de ensino estadual. Nos Jogos de Comunicação, uma boneca inflável foi utilizada por alguns alunos da Facha para insultar as alunas da PUC-Rio.


No Auditório 2 da faculdade de Direito, aproximadamente 50 alunos reuniram-se para debater, entre outros pontos, proposições práticas para o problema do uso de representações machistas pelas torcidas, em músicas e caricaturas. Os diretores do CAEV, Victor Quintas e Carlos Reis, conduziram o debate, que também contou com a presença de integrantes da atlética do curso.


Uma das questões mais debatidas foi a forma de torcer. “É real uma torcida na qual as pessoas não se ofendam?”, perguntou M., integrante da atlética de Direito. “Uma das funções da torcida é desestabilizar a equipe adversária. E, para tanto, você buscará algo amoral para contrapô-la. Para desestabilizar, você vai acabar ofendendo a dignidade da pessoa, de uma certa forma. Não existe uma forma polida de torcer”, pontuou ele.




[caption id="attachment_5040" align="aligncenter" width="470"]DSC07858 O debate contou com a participação de alunos de períodos variados (foto: Fabio Peixoto)[/caption]

L., aluna do 3º período do curso de Direito, por sua vez, apresentou outra visão do que podem ser as torcidas. “Melhor do que você atacar todos os jogadores adversários é saber o nome de todos os seus jogadores. A função é mais elevar a moral do seu time do que o contrário”, comentou a aluna, que afirma se orgulhar da música “A UFF é foda!”.


X., aluna de Engenharia, presente no evento, vai mais além e aponta um alvo geral dos cânticos. “As músicas não enaltecem ou desmerecem um jogador pontual. Elas estão sempre desmerecendo os negros e as mulheres. Eu, como mulher negra, sinto isso”, destacou a futura engenheira. “O discurso só reforça as lacunas da sociedade. Como um meio que se diz super esclarecido, só reforça o status quo?”, indagou aos participantes do debate.


O., aluno do 2º período da graduação em Direito, porém, acredita ser muito difícil haver alguma mudança. “Sendo pragmático, não acredito ser possível mudar esse quadro. Até acho que devia haver um certo limite, mas se todas as faculdades cantam, há uma certa aceitação disso tudo. Está muito enraizado”, afirmou o estudante. “Eu vejo graça em boa parte das músicas”, revelou ele.


M., estudante de Comunicação Social, trouxe à luz a importância do contraponto crítico do ambiente universitário ao senso comum da sociedade. “O motivo pelo qual nós não conseguimos enxergar uma alternativa para torcer é que a nossa formação - heteronormativa, falocêntrica, machista - é tão forte que a única linguagem que a gente encontra na hora do esporte, que é um lugar de paixões, é essa linguagem preconceituosa”, argumentou ele. “Nossa maior missão, enquanto estudante universitário, é desnaturalizar essa visão.”




[caption id="attachment_5041" align="aligncenter" width="470"]DSC07827 Os diretores do CAEV, Victor Quintas e Carlos Reis, conduziram as discussões (foto: Fabio Peixoto)[/caption]

K., que frequenta o 2º período de Direito, expressou seu medo de que discussões mais aprofundadas sobre a temática possam ameaçar o modelo de Jogos Jurídicos e a própria torcida. “Eu não quero que a torcida acabe como é. Tenho plena consciência do machismo, mas não quero que os Jogos acabem”, comentou ela, que não vê maiores repercussões no conteúdo dos gritos de torcida. “Será que eu cantando que ‘na PUC só tem cuzão’, alguém botou a mão na cabeça e falou: ‘Eu sou cuzão?!’. Quando eles cantarem alguma coisa para a nossa faculdade, eu não vou me sentir ofendida. Vou querer gritar de volta”, ressaltou a graduanda.


J. M., do 3º período, preocupa-se com os meios de se conscientizar as massas envolvidas nos jogos. “Quando você tenta mudar um grupo que naturaliza uma prática, a censura tem efeito muito pior do que o convencimento de que aquela postura é ridícula. Temos que desconstruir o preconceito em torcida”, comentou o aluno.


Victor Quintas, diretor do centro acadêmico, rebateu a fala de seus colegas, destacando a necessidade de se sugerir alternativas aos Jogos Jurídicos. “Ninguém está propondo acabar com os Jogos ou a torcida. Queremos reformulá-la para adequá-la às novas mudanças, para que todos se sintam satisfeitos e não somente um grupo, seja ele minoritário ou majoritário”, explicou o condutor da mesa. “A mudança é um processo longo e demorado. Nós devemos levar um novo modelo aos Jogos Jurídicos, que vai chamar muito mais atenção do que continuar tentando ser a torcida mais agressiva.”


Gabriel Menezes, porta-voz da Atlética de Direito, concordou com a abordagem e anunciou uma proposta de intervenção sobre o tema a ser levada à Coordenadoria Regional dos Estudantes de Direito e a Liga Jurídica, formada pelas instituições fundadoras da competição. “É uma imagem a zelar dos próprios Jogos Jurídicos e ninguém quer associá-lo ao preconceito, brincadeiras ruins e situações violentas e desagradáveis”, afirmou o aluno do 7º período.

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