Exposição “Resistir É Preciso” retrata o cenário da ditadura militar brasileira
Por Amanda Oliveira, Clara Barreto e Gabriela Novaes
No dia primeiro de abril, a ditadura militar no Brasil (1964-1985) completou 50 anos e, com a abertura dos arquivos e o trabalho da Comissão Nacional da Verdade, histórias começam a ser desvendadas e confirmadas, apesar de muitas ainda continuarem no esquecimento.
Com o objetivo de levar ao público um pouco do que foi esse período, a exposição “Resistir É Preciso” está rodando o país. Esteve, desde agosto do ano passado, em Brasília, São Paulo, Rio de Janeiro e, atualmente, encontra-se em Belo Horizonte, Minas Gerais. O memorial ficou em cartaz de 12 de fevereiro a 28 de maio, no Centro Cultural Banco do Brasil (CCBB), no Centro do Rio de Janeiro.
Diferente de um museu, que celebra os tempos de outrora, um memorial tem como objetivo deixar a memória dos acontecimentos viva para que aquilo não se repita. Por esse motivo, faz-se tão importante um sobre a ditadura, como a exposição idealizada pelo Instituto Vladimir Herzog, em parceria com o Ministério da Cultura e Centros Culturais.
A exposição, que já recebeu mais de 300 mil visitantes, apresenta o caminho da imprensa que lutou pela retomada da democracia, além de parte da produção artística da época. Ela é variada e mostra desde jornais da época que sofreram censura até uma linha do tempo com os principais fatos de cada ano.
Quem viu aprovou
O silêncio permanecia apesar da grande quantidade de pessoas presente. Os olhares atentos analisavam as truculências e a resistência ao sistema estampadas nas paredes. Quem estava ali parecia realmente interessado em conhecer a história do Brasil, a própria história.
O historiador de arte Roberto Campaneruti, de 29 anos, se mostrou satisfeito com a mostra e disse que a exposição é uma maneira de se conhecer diversos lados de uma mesma história. “A exposição engloba não só a esfera histórica, mas também tem a preocupação de mostrar todas as possíveis manifestações no período em virtude dessa censura, do fim dos direitos individuais, que foram caçados com a ditadura na época. É uma oportunidade de conhecer os pontos de vista das pessoas que estavam à margem do sistema”, afirmou o historiador.
Cerca de 99 mil pessoas prestigiaram a temporada no Rio de Janeiro. Desde excursões escolares, historiadores e estudantes, até famílias, grupos de amigos e pessoas sem qualquer vínculo com a área esperavam compreender melhor esse período que foi tão censurado na época. A estudante de enfermagem Fernanda Soares, de 21 anos, foi uma dessas pessoas, e saiu de lá com a certeza da importância de relembrar a ditadura. “Essa exposição é importante para abrir nossos horizontes e entendermos um pouco mais do que aconteceu naquela época. Essa história, querendo ou não, pode retratar um pouco do nosso futuro”, opinou ela.
Até mesmo pessoas que viveram no período não sabiam ao certo o que acontecia todos os dias. A produtora cultural Paula Vieira era criança nos “anos de chumbo” e conta que guardava os segredos que os pais pediam, mas não entendia os motivos. “Chegamos a ter pessoas escondidas em nossa casa. Minha mãe dizia que eu não podia contar para certas pessoas, não podia contar para o vovô, por exemplo. Vários amigos da família foram presos... E eu não entendia o porquê dessas questões, mas eram parte da minha infância”, relembrou.
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Ruptura constitucional
O uso dos termos “golpe” e “revolução” foi tema das entrevistas realizadas na exposição. Segundo o professor de Filosofia e estudante de História Henrique Ribeiro, o conceito de revolução é um movimento popular e o de golpe é uma mudança na conjuntura política, por isso o golpe de 64 não pode ser considerado uma revolução. “O conceito de golpe é uma ruptura política vinda de cima para baixo, empurrada goela abaixo. Por isso que a expressão ‘revolução’ serve para dar uma cara popular ao movimento.”
O professor de História Antônio Reis, de 44 anos, da Fundação Santo André, corrobora essa afirmação: “O uso da palavra revolução é um termo equivocado do ponto de vista histórico, porque o que aconteceu foi uma ruptura constitucional, promovida pelas forças armadas, um certo segmento da classe média, da Igreja Católica, com apoio importante do governo norte-americano, mas isso não se caracteriza como um processo revolucionário. O que aconteceu em 64 foi claramente um golpe de Estado, uma ruptura, a destituição de um presidente democraticamente eleito.”
Daqui para frente será diferente (?)
As opiniões dos visitantes à exposição foram divergentes sobre uma possível volta do sistema de ditadura militar. O estudante de biologia, de 22 anos, Rafael Koster da Costa defende a opinião de que a ditadura ainda pode estar em vigor, de uma forma mais branda e disfarçada: “Temos imposições, censura, situações de truculência, mas elas não são mais tão visíveis e óbvias como eram no período da ditadura. Talvez a forma de ditadura tenha se tornado algo mais sutil e comercial, porém presente ainda de alguma forma”, opinou ele.
Por outro lado, há quem tenha a certeza de que o período da ditadura tenha ficado no passado e não fará parte do futuro de nosso país. O arquiteto Evandro Pereira da Silva afirma que “os anos 1960” ensinaram que o caminho não é o sistema ditatorial: “Eu acredito que o nosso momento político não seja favorável para a volta de uma ditadura e que a classe média não vai mais apoiar um golpe de Estado desse. Eu tenho essa esperança”.
Ainda que não existe a certeza do que acontecerá no futuro, memoriais como este mostram os resultados do passado e, com isso, tentam evitar uma possível repetição do erro.
Assista também ao vídeo da entrevista na íntegra com o sociólogo e estudante de história Henrique Ribeiro:
http://www.youtube.com/watch?v=fGGFm2KVkfw
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