por Carolina Lopes
Dez anos. Esse foi o tempo
necessário para o rendimento anual de mulheres ser igual ao dos homens. Igualdade
alcançada, então? Não. Em 2015, as mulheres passaram a ganhar, por ano, o que
os homens ganhavam em 2006. E mais, a diferença entre o pagamento anual dos
gêneros aumentou de cinco para 10 mil em 2015.
Por meio do Relatório Mundial de Desigualdade de Gênero de 2015, o Fórum Econômico Mundial constatou que somente
em 81 anos a igualdade de gênero será alcançada. O relatório comparou os dados
coletados em 2006 e em 2015 em algumas variáveis como educação, economia, saúde
e política, na qual se encontra a maior diferença. Ainda são raras as mulheres
em cargos de Governo – 19% entre parlamentares e 18% em cargos ministeriais,
por exemplo.
A população economicamente ativa
também é diferente. O relatório da ONU Progresso das Mulheres no Mundo 2015-2016: Transformar as economias para realizar os direitos mostrou que o percentual é de 50% entre as mulheres e 77% entre os
homens. Quando se analisam os dados entre as próprias mulheres, mais diferenças
aparecem, como mostrou a publicação Estatísticas de gênero: uma análise dos resultados do censo demográfico 2010, lançada em
2014 pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). É de 56,2% a
taxa de atividade entre as mulheres brancas, frente a 53,1% das negras, que
também têm menor rendimento e frequentaram menos o ensino superior.
Nenhum país do mundo atingiu a
igualdade de gênero e os que mais se aproximam disso estão em um nível de aproximadamente
80% de paridade – os cinco primeiros países têm índice entre 0.807 e 0.881 (de
1.00, no máximo). A Islândia ocupa a primeira posição. O Brasil é o 85º
colocado (de 145 países) com um índice de 0.686. O mais preocupante, no caso
brasileiro, é a (falta de) igualdade política, que beira os 20%. O relatório
foi concluído em 2015, ou seja, esse índice pode estar ainda pior depois da
exclusão de mulheres de cargos do Governo com Michel Temer.
Além de estarem em menor
quantidade no mercado, elas também ganham menos que os homens para desempenhar as
mesmas funções. Estatísticas no nível nacional (IBGE) e mundial (ONU) mostram
que o rendimento feminino é aproximadamente 30% inferior. Segundo o IBGE, a
situação se agrava com as negras, com salários que equivalem a 52% do das
mulheres brancas. A população feminina residente nas áreas rurais é a que
apresenta o menor rendimento dentre as mulheres.
A nota técnica Mulheres e trabalho: breve análise do período 2004-2014, do Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada) e do Ministério
do Trabalho e Previdência Social (MTPS), divulgada em março deste ano, apontou
avanços das brasileiras no mercado de trabalho, mas mostrou que os homens
continuam sendo maioria e detentores de maiores salários. Apesar do rendimento
salarial das mulheres ter aumentado 61%, o dos homens também aumentou (43%) e
eles ainda ganham mais, especialmente os homens brancos.
Trabalho doméstico
Pela colocação do Brasil no
ranking de igualdade de gênero, percebe-se que os brasileiros estão longe de mudar
a postura em relação a algumas práticas. O trabalho doméstico é uma delas.
Segundo o relatório da ONU e a nota do Ipea, a jornada feminina em casa é mais
que o dobro da masculina. Os homens são responsáveis por dez horas semanais, já
as mulheres, por 25 horas, “configurando aquilo que se chama dupla jornada de
trabalho”, segundo a nota do Ipea.
Dentre as mulheres, 90%
declararam ao Ipea fazer alguma atividade doméstica, enquanto com os homens, o
número cai para 51%. Elas acabam se prejudicando e ficando mais vulneráveis no
mercado por terem dupla jornada de trabalho.
Essa diferença não surge no
casamento, mas sim com distinções de gênero e estereótipos construídos desde a
infância. Meninas brincam de casinha e meninos de carrinho. Meninas jogam vôlei
e meninos, futebol. Meninas são mais sensíveis e meninos, mais fortes. Meninas
ganham mini cozinhas, mini vassouras e desde cedo são estimuladas a fazer a
tarefa doméstica, o que não acontece com os meninos. As meninas brincam de ser
mãe, de cuidar da casa e da família, mas os meninos também serão pais um dia,
então qual o problema de brincar de boneca?
“O menino não é
estimulado a ajudar nas tarefas domésticas. A menina ganha vassoura, fogão,
boneca para cuidar e o menino, bola para jogar futebol”, André Simões (IBGE)
Só para as minas
Mobilizada pelo caso de estupro
coletivo que ocorreu no Rio de Janeiro em maio deste ano, a professora Juliana
Ricci sentiu que precisava fazer algo pelas mulheres. Juliana já fazia parte de
outros grupos feministas, mas nunca tinha visto um com foco no mercado de
trabalho. Foi então que no início de junho surgiu o Indique uma mina, um grupo fechado no Facebook que já conta com quase
85 mil mulheres.
Logo depois de criado, Juliana
percebeu que não conseguiria administrar o grupo sozinha e fez uma chamada
pública, que foi atendida por 15 meninas que hoje a ajudam na moderação. Todos
os dias, segundo Juliana, uma média de 700 solicitações de entrada passam por
uma intensa fiscalização das moderadoras para filtrar apenas boas
oportunidades, evitando ciladas.
No grupo são oferecidas vagas e
muitas também procuram indicações de serviços e as moderadoras sempre recebem
respostas positivas de mulheres que conseguiram alguma oportunidade através do
grupo.
O IUM é exclusivo para mulheres,
para aumentar cada vez mais as oportunidades para elas, que já são menos
contempladas do que homens no mercado de trabalho. Desse modo, segundo Juliana,
com mais participação feminina no mercado, a representatividade aumenta e mais
decisões podem ser tomadas por elas, contemplando as mulheres. Para a professora, essa é a importância do crescimento
do grupo e desse espaço exclusivo, sendo “uma grande prova de quanto precisamos
de mais representatividade em todos os âmbitos, principalmente na esfera
política, até porque não são homens que vão saber fazer leis que nos contemplam”,
destacou.
Apesar de achar que a mudança
está sendo feita de forma lenta, Juliana acredita que cada vez mais mulheres
estão se descobrindo feministas, “que nada mais é do que lutar por igualdade e
querer ocupar mais espaços que antes eram dominados por homens”. Segundo ela, o
grupo cresce a cada minuto e as mulheres são solidárias umas com as outras,
fazendo do êxito de uma, um ganho para todas, com a inserção crescente no
mercado de trabalho.
Como alcançar a igualdade?
Ao final de seus relatórios, o
Ipea e a ONU determinam ações estratégicas e recomendações a serem seguidas
visando a igualdade no mercado e a autonomia econômica das mulheres.
A nota do Ipea prevê o
estabelecimento de 21 ações, como promover a capacitação e permanência de
mulheres no mercado em ocupações que não reforcem a divisão sexual do trabalho,
proporcionar políticas que igualem as responsabilidades familiares, realizar
estudos sobre a situação da mulher e a desigualdade de gênero, valorizar o
salário mínimo a longo prazo, ter a questão de gênero e o feminismo presentes
na formação de uma economia solidária igualitária, dentre outros.
O relatório da ONU destaca dez
recomendações, como criar mais e melhores trabalhos para as mulheres,
reorganizar e redistribuir o trabalho doméstico, possibilitar um ambiente
favorável à realização dos direitos das mulheres e reduzir a desigualdade
salarial, dentre outros.
A nota do Ipea também
destaca as desigualdades de classe, raça e etnia e defende que as políticas
públicas “contribuam para a democratização plena das relações sociais,
eliminando toda e qualquer forma de discriminação e garantindo que todas as
mulheres gozem de direitos e proteção social plena”.
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