Por Carolina Lopes
Depois que passa a Páscoa, uma das épocas em que o apelo para o consumo é grande, já começam as propagandas para o Dia das Mães. A sociedade tem rituais de consumo, como defende Jesús Martín-Barbero, que “fixam pautas, criam modelos, que têm cenários, que assinalam épocas, tempos propícios”. É assim na Páscoa, Dia das Mães, dos Pais, Natal, Dia das Crianças.
Apesar de sempre surgirem inovações na publicidade durante todas essas datas, geralmente estereótipos sociais continuam sendo reforçados e vemos os mesmos discursos sendo propagados. No século passado, as propagandas mostravam as mulheres como donas de casa, que têm a função de cuidar do marido e da casa, frágeis e dependentes do grande provedor da casa, o homem. O site Propagandas Históricas reúne diversos anúncios e é possível ver esse tipo de publicidade lá.
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"O Chef [a batedeira] faz tudo, menos cozinhar. É pra isso que existem as esposas!" |
No Dia das Mães não é diferente, muitas propagandas carregadas de machismo e estereótipos são veiculadas até hoje. Um anúncio da Brastemp de 1978, por exemplo, diz que com a lavadora da marca, sobra mais tempo para as mulheres serem mães, já que “o tanque acaba com qualquer mãe”.
Pode parecer coisa do século passado, mas até hoje esse tipo de publicidade é veiculada, principalmente pelas marcas de eletrodomésticos. A campanha da Britânia para este Dia das Mães mostra a criação de um novo produto, a Multiresolvedora, que é comparada à mãe. O vídeo está disponível no canal do Youtube da marca. Além do vídeo oficial, foram divulgados outros, menores, também comparando as mães aos produtos, que são um tipo de “faz tudo”.
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Fonte: Facebook da Britânia |
Analisando as redes sociais da marca, é possível ver que muitas pessoas gostaram da campanha e acharam uma homenagem linda, o que reflete o pensamento machista introjetado na sociedade e os estereótipos ligados à mulher e mãe, que são naturalizados. A Reserva também já foi alvo de críticas por estampar a seguinte frase na etiqueta de suas roupas: “para entender melhor a simbologia de lavagem, acesse www.usereserva.com/cuidadoscomaroupa. Ou dê para a sua mãe. Ela sabe como fazer isso bem.”
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Comentário na página do Facebook da Britânia |
Além disso, quando uma marca tenta mostrar uma mãe moderna, muitas vezes acaba caindo na questão de ser tão maravilhosa que consegue trabalhar e continuar dando conta dos afazeres domésticos e de cuidar dos filhos. Mostra um ser que tem o dom mágico da maternidade, que consegue lidar como ninguém (certamente melhor que o pai) com as situações da casa e ser independente. Mas, quem disse que a mãe real, de hoje, é assim?
No lugar de todas essas representações, seria ideal se a publicidade tentasse diminuir com a desigualdade que ainda há em relação aos papéis de mãe e pai. Lara Vascouto mostra, aqui, que até os comerciais do Dia dos Pais refletem isso, muitas vezes com eles sendo ‘desajeitados’ fazendo funções teoricamente simples como trocar uma fralda. Mas acaba sendo ‘bonitinho’, o pai que quer ajudar, ser presente. Só que é reforçada a ideia que esse não é o papel de um pai (logo, é da mãe), porém, deveria ser da família toda.
Uma campanha que saiu há pouco tempo e rendeu comentários positivos foi a da C&A, que traz mães de diferentes estilos, deixando os padrões de lado, mostrando que não há certo ou errado quando o assunto é maternidade. O vídeo está disponível no canal no Youtube da marca.
A simbologia e o carinho acerca do Dia das Mães é sim muito especial, mas mães não precisam ser donas de casa OU trabalhadoras, não são seres mágicos e “multiresolvedoras” que têm o dom divino da maternidade (até porque nem toda mulher quer ser mãe). Mães são pessoas reais, que amam seus filhos, mas que também enfrentam muitos desafios, muitos desses por serem responsabilizadas (sozinhas) pelas funções a elas atribuídas socialmente e reforçadas por parte da publicidade.
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