São eles: uma argentina da Al Jazeera English; um norte-americano, autor de ‘Brazillionaires’, do New Yorker; um francês freelancer e uma brasileira da Sputnik News
Por Lizandra Machado e Marcella Ramos
No início da década de 2010, o Brasil estava no auge. Após dois mandatos do presidente Lula e prestes a eleger sua primeira presidente mulher, o país era a 70ª economia mais aberta do mundo, produzia mais petróleo que a Noruega, a Ambev se tornara uma das mais importantes empresas do globo, era o maior exportador de carne do planeta e 40 milhões de pessoas saíram da miséria. Além disso, a descoberta do Pré-Sal e o nascimento de toda uma classe de bilionários brasileiros atraía os olhos do exterior para o maior país da América do Sul, por muito tempo conhecido apenas pelo samba, 'mulatas' bonitas e a violência. Como cereja do bolo, passaria a sediar os dois mais importantes eventos esportivos do planeta: a Copa do Mundo, em 2014, e os Jogos Olímpicos, em 2016. O Brasil avançava a passos largos para se tornar uma potência. Junto com o progresso, vieram os jornalistas.
Segundo pesquisa realizada pelo Ministério do Turismo em parceria com a Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas (Fipe), 18.800 jornalistas foram credenciados pela FIFA para a Copa de 2014. Desses, 80% eram estrangeiros e a maioria residente na Argentina (24,8%), Colômbia (9,7%) e México (6,2%). O estudo também aponta que São Paulo (58,3%), Rio de Janeiro (53,0%), Belo Horizonte (28,6%), Porto Alegre (22,3%) e Salvador (19,8%) foram as cidades-sede mais visitadas pelos profissionais da imprensa. O levantamento foi realizado de 19 de junho a 2 de julho com 350 profissionais nos locais que concentravam a maior parte dos jogos da Copa.
Já os Jogos Olímpicos Rio 2016 atraíram 25 mil jornalistas de 105 países, de acordo com informações publicadas pela Associação Brasileira de Imprensa (ABI). Na época, a NBC, principal rede de TV norte-americana, montou um dos seus estúdios na areia da Praia de Copacabana, Zona Sul do Rio de Janeiro. E, para apresentar o jornal noturno, o canal trouxe o âncora Lester Holt, uma das estrelas do seu jornalismo.
No entanto, tão rápida quanto a subida foi a queda. Em 2015, o baile começou a dar sinais de fim de festa. Terminados os jogos, a maior parte dos correspondentes que começaram a cobrir o país assim que os grandes eventos foram anunciados, deixaram o Brasil. De qualquer forma, não dá para dizer que a atenção foi extinta. Quase um ano após as Olimpíadas, o país ainda desperta o interesse no noticiário internacional. As razões para isso podem ser muitas – contexto histórico-político-social, direitos humanos, belezas naturais, Floresta Amazônica, exotismo, entre outros. O Casarão conversou com quatro jornalistas ligados à cobertura internacional para conhecer suas impressões e o quê o Brasil tem de diferente.
*Acompanhe a primeira conversa da série.
Teresa Bo, da Al Jazeera English
Repórter da Al Jazeera English, a argentina Teresa Bo trabalha na sucursal da maior rede de TV árabe, em Buenos Aires. Da capital argentina, ela faz a cobertura da América Latina, na língua inglesa, não só para o mundo árabe. Segundo ela, o canal tem uma recepção muito boa, principalmente na internet, além de um grande público.
“Temos uma grande comunidade árabe em São Paulo, no Brasil, mas não atraímos somente esse público. Em vários campos a Al Jazeera se destaca por parecer um meio bastante imparcial. Nós nos apresentamos como uma mídia internacional. Isso é muito bom, pois hoje você tem que estar com a grande mídia e poder ter a liberdade de falar com todos os atores. Nos apresentar como um meio internacional nos dá muita liberdade. Eu vejo isso como algo muito positivo”, ressalta Teresa.
As reportagens produzidas na Al Jazeera English vão além do Oriente Médio e, quando há a necessidade de cobrir o Brasil presencialmente, Teresa se desloca até o país. “No Brasil, cobrimos muita política e economia. Mas sempre tentamos fazer reportagens sobre como isso afeta a vida das pessoas e tudo que está acontecendo. Agora, com o desenrolar da corrupção, como isso afeta o cotidiano. Esse é o nosso foco mais importante. Muita política, muita Brasília, São Paulo e Rio também”, explica.
De acordo com a jornalista, os temas sobre o Brasil pautados pela rede de TV se devem ao interesse prévio do público e a repercussão internacional do assunto. “Fazemos muitas reportagens sociais, sobre as necessidades das pessoas. Quando estamos aqui, vamos às favelas e vemos o que as pessoas precisam, como elas estão. Temos muita liberdade com temas, mas também fazemos muitas reportagens com pessoas em situações mais vulneráveis”, revela Teresa.
Coberto de estigmas e comumente associados ao terrorismo, o povo árabe observa a incompreensão mundial. A visão ocidental sobre o mundo árabe é pouco informada e carregada de preconceitos, como sentiu Teresa quando iniciou na rede. “A princípio, sim, pois era visto como um canal árabe em que as apresentadoras teriam que cobrir a cabeça com um véu. No entanto, não é bem assim. A Al Jazeera em inglês é feita com muita gente estrangeira, profissional, com experiência. Além disso, o canal em inglês, apesar de ser originalmente árabe, é um canal internacional”, explica.
No que se refere às diferenças de cobertura do canal árabe para os outros veículos, a repórter sente que há um interesse muito maior pelo que acontece na América Latina, em comparação com outros veículos. “Os outros meios só se importam quando algo é muito grande. Estamos o tempo todo fazendo reportagens da região. A BBC também tem a BBC Brasil e a BBC em espanhol, mas eles não fazem tanta cobertura como a gente. Sinto que fazemos muito”, destaca.
Teresa iniciou sua carreira em Washington, nos Estados Unidos, como estagiária da rede de TV norte-americana CNN. Mais tarde, ela virou freelancer e foi trabalhar no Oriente Médio. “Fiquei em Gaza, vivi no Afeganistão por três anos. Em 2006, fui trabalhar para um jornal espanhol e, no mesmo ano, a Al Jazeera lançou um canal, em inglês, e me ofereceram o trabalho em Buenos Aires para cobrir toda a América Latina. Me pareceu bastante interessante e aqui estou”, conta ela, que completa: “Eu trabalhei muito no Haiti, no Iraque, na Colômbia, no Brasil e sempre vejo coisas muito dramáticas, mas eu sempre tento pensar algo positivo e sobre como sou privilegiada”.
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