Por Marry Ferreira e Andressa Amendola
Niterói.
Século XXI, ano 2017. Apenas 104 jovens com deficiência ingressaram na UFF
no primeiro semestre. A acessibilidade possui particularidades que precisam ser
atendidas caso a caso. Se a mobilidade ainda restringe jovens deficientes do
seu direito de ir e vir, imagine um ambiente universitário sem suas diferentes
adaptações no que diz respeito à inclusão.
Clara Sasse,
19, é caloura de Ciências Sociais e deficiente auditiva. Quando ingressou na
universidade, a maior barreira era o conhecimento limitado de professores e
funcionários sobre a cultura surda, principalmente no saber das diferenças
entre o oralizado e o surdo que usa libras. “Professores que não possuem boa
dicção e falam muito sem escrever dificultam o aprendizado, pois faço leitura
labial e perco o ritmo da aula quando paro para escrever. O fato de alguns
deles não entenderem essa necessidade, já mostra que a universidade não é um
ambiente adaptado e preparado para atender alunos surdos”.
Vanessa Rodrigues, 33, está na segunda
graduação na UFF e enfrenta os mesmos problemas no curso de Ciências
Contábeis. “Larguei o curso de Química pois o excesso de material em inglês
dificultava minha comunicação como deficiente auditiva. Uma vez, tive um
professor que usava um bigode muito grande e era impossível fazer leitura
labial. A coordenação disse que resolveria o problema mas, na aula seguinte,
ele estava sem bigode, fazendo piada e muito irritado. Expliquei que só
precisava que ele cortasse um pouco ou me transferisse para outra turma e ele
entendeu”.
A psicóloga Luana Vieira explica que o ideal é um aluno cego poder contar com mídias que favoreçam seu estudo, assim como o surdo ter um intérprete nos ambientes que frequenta, mas ter a autonomia de decidir quando usá-los. O indicado é o jovem encontrar um ambiente inclusivo e que se adapte às suas necessidades para não se sentir isolado em meio a tanta informação inacessível e, a partir disto, desistir de estar naquele local.
A Instrução
Normativa nº 128/2016, da Agência Nacional de Cinema, regula a acessibilidade
visual e auditiva nos segmentos cinematográficos, assim como a eliminação de
barreiras que limitem ou impeça a participação social. Mas, apesar de todas as
leis, a realidade é bem diferente. Luciane Rangel é surda, professora de Libras
na UFRRJ, mestre em diversidade e inclusão pela UFF e não tem acesso facilitado
ao teatro. “Me sinto excluída dos eventos culturais. Amo me enriquecer com
vários tipos da cultura porém, isto é limitado! Meu desejo é de que tenha
libras em todas as escolas e em todos níveis da educação. As crianças ouvintes
podem aprender libras o mais cedo possível e assim, crescerem bilingues ou
multilingues - português e libras, ou mais língua.” Hoje, apenas os cursos de
licenciatura das instituições de ensino superior são regulados (Lei
10.463/2002) para ofertar a disciplina de Libras no currículo.
Lucilia
Machado, Mestre em Diversidade e Inclusão pelo Curso de Mestrado Profissional
em Diversidade e Inclusão/UFF e Coordenadora do Sensibiliza UFF, divisão de
acessibilidade e inclusão, criada em 2009, é tetraplégica há 18 anos e enfrenta
desafios relativos ao ingresso e permanência dos alunos com deficiência. “Não
conseguimos fazer metade do que é proposto por falta de mão de obra, dinheiro e
falta de uma política institucional da própria universidade, que precisa
efetivar a implementação da inclusão”. Lucília é formada em Jornalismo pela
UFF e trabalhava na instituição antes mesmo de se tornar deficiente. Após o
acidente de carro que sofreu há 18 anos, a coordenadora fez diversas mudanças
até encontrar um local acessível, quando percebeu a necessidade de lutar pela
inclusão. “Muitos não se comunicam por medo de sofrer preconceito e nós
precisamos dessa informação para correr atrás de políticas de acessibilidade”.
Para atender o Art.42 do Estatuto do Portador de Deficiência, que exige os
meios e recursos necessários para atendimento especializado a alunos com
deficiência no ensino superior, todos os ingressantes encontram um formulário
no IdUFF onde podem relatar suas necessidades. No ano passado, a UFF recebeu
30 alunos com deficiência, disponibilizou 30 bolsas no programa
Bolsa-deficiência e três vagas adaptadas no alojamento.
Andrea
Farias, graduada em pedagogia pela UFF, tem nanismo e contou com a ajuda do
Sensibiliza para permanecer na Universidade. “Por eu ter deficiência física e
baixa estatura, coisas simples do cotidiano se tornavam mais dificultosas,
como, por exemplo, sentar-se na carteira escolar e ir ao toalete”. No site do
Sensibiliza, a estudante realça que a Universidade precisa se adaptar e
continuar atenta à algumas melhorias, como minimizar burocracias no momento de
aquisição de equipamentos que ofereçam suporte às pessoas com deficiência.
Apesar de
todos os avanços, muito
ainda precisa ser feito. Com a aprovação de cotas para pessoas com deficiência
(Lei 13.409/2016) no ENEM 2018, aumenta o ingresso e também a preocupação com
a acessibilidade. As instituições não estão totalmente preparadas para garantir
um acesso diário de qualidade, seja por falta de preparação dos professores ou
pelo déficit na estrutura. Muitos projetos existem somente no papel e precisam
que seus métodos sejam implementados. “É preciso mais do que nunca que a
universidade assuma a inclusão como uma diretriz básica”, diz Lucília.
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