Por Jéssica Simões
Realizada
pelo Ibope e encomendada pelo Instituo Pró-Livro, no ano de 2016, a pesquisa
Retratos na Leitura do Brasil aponta dados desanimadores para os escritores,
editores e amantes da Literatura: a média de livros lidos anualmente é de apenas
4,96 por ano. Desses, 0,94 são indicados pela escola e somente 2,88 lidos por
vontade própria. Nesse cenário, fica cada vez mais criterioso o trabalho de
editoras. Como apostar em novos talentos sem a certeza das vendas? Por outro
lado, o que leva autores iniciantes a ainda tentarem fazer da escrita o seu
oficio? Como desbravar caminhos aparentemente fechados?
Nascido
em Nova Iguaçu e sem influências diretas na literatura, o escritor Thiago
Kuerques procurou caminhos alternativos para ser lido. A principio postava seus
textos em um blog, até que conheceu a autopublicação, modelo onde o autor
custeia a impressão de seus próprios livros. Assim, Thiago publicou suas duas
primeiras obras, O Cara Que Não Publicava
Livros e Ensaio dos Poemas Pelados. E
esse ano, sua obra mais recente,
Território, um livro de contos que usa a Baixada Fluminense como cenário. A
empreitada também não foi fácil.
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Thiago Kuerques no lançamento de seu livro Território. Foto: Rafaela Mascarenhas |
“Teria que desembolsar mais
de sete mil reais para que a publicação saísse. Amigos me convenceram a procurar
alguma solução ao invés de já desistir. Vendi o livro antes mesmo de assinar o
contrato. Além dos amigos, amigos de amigos e até desconhecidos compraram a
ideia e cá estamos com o Território publicado no Brasil, em Portugal e em ebook
na Itália, Espanha e Holanda”, conta Thiago.
A tecnologia a serviço da
disseminação também foi o caminho escolhido pela autora Raissa Tavares, que
começou a usar o Wattpad, uma ferramenta online para que autores compartilhem suas
histórias, aos 13 anos. Um de seus livros, Os
Doze Signos de Valentina, recebeu destaque no site,na categoria romance, e
será publicado, em julho, pela Editora Record.
“Eu fico até um pouco
irritada quando alguém me diz que eu “dei muita sorte”, porque passar 11 anos
escrevendo online, juntando leitores, tentando chamar a atenção das editoras,
passando dias de semana, finais de semana e feriados escrevendo não é fácil e
não é “dar sorte”, é se dedicar inteiramente àquilo que faz”, confidencia
Raissa, que enviou seu original vinte sete vezes para editoras.
A
literatura e a periferia
Por falta de incentivo, muitas vezes moradores afastados
dos grandes centros não tem contato com o mundo dos livros. Sem gosto pela
leitura até os 24 anos, Jessé Andarilho, como é conhecido, começou a escrever
dentro do trem, enquanto ia para o trabalho, usando apenas seu celular. O autor
conta que observar as conversas alheias o tornou um “fofoqueiro literário” e
essa foi a matéria-prima de suas histórias. Seu livro, Fiel, publicado pela Editora Objetiva, conta a história de um
menino envolvido no tráfico carioca.
Em relação à propagação da literatura nas periferias,
Jessé é enfático:
“Livro é bom,
mas não tem que ser apresentado como algo que vai mudar a vida da pessoa que
vai ler. Tem que ser apresentado como uma parada maneira, tipo um filme, um CD
ou qualquer outra coisa maneira que as pessoas consomem para passar o tempo e
para ter prazer com a tal atividade.”
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Jessé Andarilho no Pavão Pavãozinho. Foto: Ana Bustamente. |
A falta de incentivo foi a
força motriz para o surgimento da Folha Cultural Pataxó.Fundada em 1998, pelo
professor, militante e poeta Fabiano Soares, e localizada em Belford Roxo, a
editora tem o objetivo de incentivar a produção literária na Baixada Fluminense,
abrangendo todos os tipos de público. A produção, feita de modo artesanal,
torna a publicação literária mais acessível. Para Fabiano, a Pataxó é mais que
uma editora.
“Não se trata apenas de uma editora,
mas um movimento que problematiza, inclusive às grandes editoras. Ajudamos a
canalizar uma produção literária já existente. Não há o objetivo do lucro. As relações
financeiras tem como objetivo fortalecer ainda mais as publicações, reprodução
dos zines, reposição de equipamentos como máquinas de impressão, estiletes,
grampeadores, papéis e outros materiais afins”, esclarece Fabiano.
Com o avanço da tecnologia
e, sobretudo, da Internet, publicar parece não ser um sonho mais tão distante.
Se alguns acreditam que a literatura se encontra em estado de alerta, outros a
fazem viva, produzindo e reproduzindo, de diferentes modos, mas com um único
objetivo: não deixar que se perca a arte de contar histórias.
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