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Intervenção militar federal: a história se repete



Foto: Ratão Diniz
                                                                      Por: Maria Eduarda Monteiro
     
       O estado do Rio de Janeiro sofre com a violência e a falta de políticas públicas eficazes no combate às causas do problema. As ações da polícia que visam a garantir a segurança da população carioca são majoritariamente voltadas para as favelas como foco da violência, afetando a vida dos moradores dessas regiões.

Marco recente no histórico da segurança pública no Rio, a implementação das UPPs (Unidades de Polícia Pacificadora) anunciada em 2008 pela Secretaria do Governo do Estado, visando retomar o controle das comunidades dominadas pelo tráfico e a aproximação do Estado com a população, sofreu seu mais duro golpe. Até o dia 27 de abril, quando o Estado anunciou que incorporaria ou transformaria algumas das unidades em batalhões, trinta e oito comunidades contavam com a presença das UPPs. Destas, ao menos 18 deixarão de manter a estrutura como idealizada há dez anos. O fracasso de mais esta tentativa de reduzir a violência, no entanto, já se anunciava há tempos. Segundo dados de 2015 do ISP (Instituto de Segurança Pública), o Rio de Janeiro teve uma redução da taxa de letalidade violenta a partir de 2009, sobretudo nas localidades com UPPs. Entretanto, a partir de 2013, essa taxa voltou a crescer em todo o estado, sendo ainda mais expressiva nos locais com as polícias pacificadoras. Para os moradores de favelas fica mais uma experiência de militarização do cotidiano.


O professor João Braga Âreas, que também foi um dos produtores do documentário “Pacificação? As UPPs e a violência no Rio de Janeiro”, explica a lógica excludente das polícias pacificadoras: “As UPPs privilegiaram algumas regiões da cidade. Tem um claro benefício da Zona Sul, então os traficantes migram para as outras regiões; houve uma migração para territórios menos nobres, que recebem menos atenção do Estado.”


O pesquisador também lembra o que está em jogo quando se utiliza a expressão "pacificação" em referência à política de segurança voltada para as favelas. “O termo pacificação remete à história: os índios foram ‘pacificados’, revoltas no Brasil no período do Império e da República foram esmagadas em nome da pacificação”, conta João Âreas. 

        Apesar da promessa de redução da violência e mesmo com a diminuição de alguns índices de criminalidade, muitos moradores ainda declaram não se sentirem beneficiados com a presença da PM no cotidiano. Um morador e ativista do Complexo do Alemão, a comunidade com mais registros de mortes violentas em 2015, faz um relato anônimo: “Não faz sentido você colocar um policiamento no local para que possa haver confrontos, já que continuam entrando na favela armas e drogas. O que faria sentido era evitar que essas coisas entrassem na comunidade.”


Esse ano, em 16 de fevereiro, foi anunciada a intervenção federal militar no estado do Rio de Janeiro pelo presidente Michel Temer, e está prevista para findar em novembro. A imprensa teve papel fundamental na construção da opinião pública sobre o acontecido: durante o Carnaval, que aconteceu na mesma semana da intervenção, a grande mídia fez um trabalho alarmista acerca da segurança nos blocos, o que fez com que a população entendesse que uma medida urgente era necessária para cessar o caos noticiado.

Três dias após a intervenção ser decretada, Temer solicitou ao poder Judiciário a expedição de mandados de prisão e busca e apreensão das Forças Armadas no estado. Raul Julgman, ministro da Defesa, alegou que os mandados eram essenciais para o sucesso no combate ao crime organizado. Por outro lado, nos dias que sucederam, o MPF emitiu uma nota posicionando-se contra o pedido do presidente, alegando que os direitos individuais garantidos pela constituição estavam sendo violados.

     No dia 23 de fevereiro, as comunidades Vila Kennedy, Vila Aliança e Coreia, todas na zona Oeste do Rio, presenciaram operações das Forças Armadas em que os moradores estavam sendo fotografados e identificados pelo setor de inteligência das forças de segurança. O presidente da Comissão Pública OAB, Breno Melaragno, relata que não há unanimidade jurídica sobre o fichamento nas favelas, uma vez que reter o cidadão para que o procedimento seja feito não é uma ação legal. Apesar da proposta da intervenção ser voltada para garantir a segurança de todo estado, os moradores das comunidades são tratados como foco da violência: “As forças estatais enxergam as pessoas que moram nessa localidade [nas favelas] como potenciais bandidos ou traficantes”, afirma o morador do Alemão.

Militares na Operação Ficha Limpa/ Foto: Pablo Jacob - O Globo


Após pouco mais de dois meses, a intervenção não foi satisfatória em números. Embora o número de homens das Forças Armadas nas ruas chegue a quase quarenta mil, apenas cento e quarenta armas foram apreendidas nesse tempo. Quanto ao número de tiroteios, segundo o relatório independente À deriva: sem programa, sem resultado, sem rumo”, aumentou em 15,2%.




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