![]() |
Acervo Fiocruz |
Por Gabrielle Fonseca
A ciência brasileira é um espaço muito restrito, no entanto, ela retrata fielmente o machismo vigente na nossa sociedade. A baixa representação feminina entre os pesquisadores, docentes e até mesmo entre os alunos nas Ciências Exatas revela a dificuldade das mulheres em se inserir nessas áreas. Como resultado, elas relatam comentários machistas, piadinhas constantes e até casos de assédio. Na Universidade Federal Fluminense o cenário não é diferente, diversos cursos da instituição apresentam um baixo número de mulheres nas ditas ciências duras. A universidade traz índices muito pequenos de meninas em cursos como Matemática, Engenharia e Física.
Os números que representam a área de tecnologia na Universidade Federal Fluminense têm os mais baixos índices de mulheres da instituição. Em Sistemas de Informação, elas são apenas 14,96% . Já em Ciência da Computação, o número cai ainda mais, com só 10,7% de representação feminina. Os dados são divulgados pela própria UFF em seu site de transparência e ainda revelam o panorama dos demais cursos da universidade.
Outros casos, como Engenharia Mecânica, com 19,26% de mulheres, e Engenharia Elétrica, com 22,5%, repetem o estereótipo de que Engenharia é um curso para homens. Áreas como Engenharia de Produção e Engenharia do Petróleo também entram nas baixas estatísticas, com uma porcentagem feminina abaixo de 30%. Além dos já citados, o curso de Física também possui índices muito ruins de participação das mulheres, apresentando somente 24,68% de graduandas.
Esses números reforçam espaços majoritariamente masculinos, criando um cenário propício para provocações e comentários maldosos. Em cursos como Ciência da Computação, com o menor percentual de mulheres na universidade, são comuns os comentários sobre a capacidade feminina. Karina Mochetti, professora do departamento de Ciência da Computação, conta que as alunas escutam frequentemente de professores que "mulher não sabe programar". A docente ainda afirma que o número excessivo de comentários já fez com que meninas desistissem de algumas disciplinas e até mesmo do curso.
Os casos de machismo atingem inclusive as áreas com um percentual um pouco maior de mulheres. Em entrevista, uma estudante do curso de Física chegou a relatar um caso de assédio que partiu de um dos docentes da instituição. "Eu já escutei de um professor que dependendo de quantas cervejas eu tomasse com ele, eu não iria precisar fazer a outra prova para passar na disciplina", disse a aluna que preferiu não se identificar.
A graduanda contou que ainda terá aulas com o mesmo professor e que esse tipo de situação impede as estudantes de tornarem público casos de machismo e assédio. Ainda em entrevista, a graduanda contou que o assédio ocorre com certa frequência e que já recebeu comentários até mesmo sobre o tamanho do seu decote. "Se eu não fosse muito persistente, eu já teria desistido da UFF", concluiu ela.
Além dos comentários e do assédio, a universidade se mostra despreparada para acolher alunas grávidas. Maria Nogueira, gestante e estudante de Física da UFF, contou que chegou a ser orientada por seu coordenador a trancar o curso por conta da gravidez. "Ninguém me explicou que eu poderia pedir regime excepcional de aprendizagem e esse é um direito concedido pela lei", afirmou a aluna.
O regime especial permite que a graduanda tenha aulas à distância no período de licença maternidade. No entanto, pela falta de informação, Maria conta que se sentiu excluída: "Não fui apoiada. Ninguém estava pronto para me ajudar e aconselhar em relação à universidade, sobre os direitos, sobre como dar conta do curso. Eu que tive que ir atrás e meter a cara", continuou a graduanda.
Em todas as entrevistas feitas para essa reportagem, foram ressaltados casos de diversas formas de machismo. Apesar disso, a própria universidade reforça a segregação em seus departamentos. Na sede de Volta Redonda, o curso de Física possui apenas uma mulher entre seus professores. Já no departamento de Engenharia Elétrica de Niterói, nenhuma professora faz parte do corpo docente.
Para essas mulheres, a universidade é o primeiro passo de um caminho difícil e nem sempre as alunas encontram apoio na instituição. Apesar de existirem projetos e alguns espaços de resistência, muitas meninas ainda se sentem sufocadas no ambiente hostil que a universidade possui. Como afirmou Maria, uma das entrevistadas: "A instituição não reconhece muitas atitudes que são machistas e isso é utilizado para que o machismo continue a existir e ser normal".
0 comentários: