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As rédeas do cinema em mãos femininas


Por Juliana Oliveira

Quantas vezes você assistiu a um filme e no final se perguntou “qual é o nome da diretora?” A resposta provavelmente será “poucas vezes” ou “nunca”. A maioria das pessoas costuma associar a grande tarefa que é a direção de um longa-metragem a nomes e figuras masculinas, enquanto as mulheres resta saber quem foi a atriz. Para saber melhor a dimensão dessa diferença, a Universidade do Sul da Califórnia, Estados Unidos, fez uma pesquisa e analisou o total de 1.100 filmes populares entre os anos de 2007 e 2016, e o resultado é lamentável. Apenas 4% dos 1.223 diretores incluídos nesse projeto eram mulheres. Mas por quê? Essa é uma realidade comum, onde cargos superiores como o de roteirista, diretor e produtor são majoritariamente dominados por homens, afetando o aumento do número de mulheres no ramo.

Getty Images

Durante a premiação do Golden Globe de 2018, a atriz, produtora e diretora Natalie Portman, ao anunciar os indicados a categoria de melhor direção, ironizou com a fala "e aqui estão os indicados, todos homens, a melhor direção". Risadas se seguiram, mas não impediu que gerasse um desconforto aos homens presentes.
A indústria cinematográfica de Hollywood transparece durante os anos uma certa discriminação contra as produções femininas, cujo espaço sempre foi criticamente limitado com a falta de oportunidades oferecidas a elas, apesar de seus trabalhos possuírem tanta qualidade quanto aos dos homens. Ao fazer uma rápida retrospectiva nos 89 anos da premiação anual do Oscar, é possível notar uma indiscutível desigualdade. Somente 5 mulheres foram indicadas à categoria de melhor direção, e apenas uma levou a estatueta para casa. Kathryn Bigelow foi a única vencedora, pelo filme Guerra Ao Terror em 2010, concorrendo contra 4 homens.

Kathryn Bingelow, única diretora a vencer o Oscar
Foto por Todd Wawrychuk

Não só a Academy Awards comprova essa realidade, como outras premiações audiovisuais. O Golden Globe premiou Barbra Streisand na categoria de melhor direção em 1984, sendo ela também a única a vencer e uma das poucas a ser indicadas em toda a história da premiação.
Aluna de cinema e audiovisual na Universidade Federal Fluminense, Alice Ripper diz existir um preconceito contra as produções realizadas por mulheres no cenário da indústria cinematográfica: “Normalmente escuta-se muitas críticas machistas e cheias de estereótipos de que produtoras costumam ser nervosas, estressadas e mandonas, mas quando é um homem realizando a mesma função, ele é assertivo, objetivo e prático". A estudante de 24 anos, que está no 3º período da graduação e pretende seguir carreira na área de direção, aponta também a necessidade de enfrentar esse desequilíbrio. “Precisamos ainda romper com esses preconceitos e subverter esses estereótipos.”
Assim como em muitos setores, o cinema é uma indústria controlada por homens e que também enfrenta casos de assédios sexuais e manipulações. Recentemente, foi iniciado o movimento “Time’s Up” devido ao grande número de denúncias de assédios no ramo do entretenimento. Um dos casos que deram início ao movimento foi o de Harvey Weinstein, renomado produtor de Hollywood, denunciado por diversas atrizes como Ashley Judd e Emily Nestor. De acordo com as vítimas, Weinstein usava sua influência e prometia impulsionar suas carreiras em troca de favores sexuais.

Não é só em Hollywood que esses casos acontecem
Já passei por vários "mansplaining" (quando um homem pressupõe que uma mulher não entende ou é incapaz de conhecer sobre determinado assunto e tenta explica-la a respeito) e a tradicional cantada, aquele “princesa” fora de lugar. Rola muito o medo de responder a esses machismos, porque a indústria infelizmente ainda é baseada em indicação, coisa que eu lamento profundamente", diz a operadora de câmera do Canal Futura, Livia Barcelos Lacorte, a respeito dos casos de assédio.
O sexismo, no entanto, não as tira totalmente do cenário. Muitos nomes femininos contribuíram para o cinema mundial e o número delas não para de crescer, lutando por seu espaço mais do que merecido. Segundo a Agência Nacional de Cinema (Ancine), o percentual de diretoras brasileiras com seus trabalhos lançados no país aumentou de 14,7% em 2015 para 20,3% em 2016. Apesar dos assédios, as mulheres se uniram e começaram a se representar como profissionais qualificadas e dignas de valorização. Quando perguntada sobre o lugar da mulher no cinema,  Livia ressalta a importância da autonomia feminina: Deveria ser o lugar que ela quisesse, né. Eu não só não acho que as mulheres sejam frágeis, como as acho melhores profissionais. Tendem a ser mais conscientes e mais coletivas, logo são melhores líderes. Minhas melhores chefes foram mulheres, de longe".

Em homenagem a toda sua força, atualmente existe o FIM - Festival Internacional de Mulheres no Cinema - que procura valorizar e prestigiar o protagonismo da mulher em longas-metragens e produções menores. A sigla “FIM” simboliza o fim da sub-representação de mulheres na indústria, ambos nacionais e internacionais. O evento aconteceu entre os dias 04 e 11 de julho desse ano em sua primeira edição no Cinesesc e Espaço Itaú de Cinema Augusta em São Paulo. Foram exibidos filmes dirigidos exclusivamente por mulheres, e no fim de cada sessão ocorreu uma votação do público para melhor produção nacional e internacional. Os vencedores receberam o prêmio de R$15 mil. Além disso, são oferecidos pelo festival cursos e masterclasses onde as profissionais podem compartilhar suas experiências.
A sua representatividade não termina por aí. Criado em 2015, o site Mulher no Cinema divulga e discute os trabalhos das mulheres inseridas em todos os cargos do cinema. Escrito pela jornalista Luísa Pécora, é o lugar ideal para quem se interessar em descobrir mais a respeito desse universo feminino por trás das câmeras, cheio de riqueza e empoderamento.

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