Por Fred Carvalho
Tratar de temas importantes relativos ao país e estimular os
estudantes a desenvolver suas qualidades é papel de toda Universidade. Mas, se para alguns o interesse é
tanto que não cabe dentro do calendário acadêmico oficial, a iniciativa de complementar o aprendido em sala de aula pode
partir dos próprios alunos. É o caso da 6ª Semana de História
da UFF, que ocorreu na última semana de setembro, no campus do Gragoatá, em
Niterói, e teve como objetivo discutir essas questões de relevância social que
impactam diretamente no futuro profissional dos estudantes do curso de
História.
Criada por uma Comissão de alunos da graduação, do mestrado
e doutorado, a SHUFF procura resgatar debates importantes da produção
historiográfica e servir ao mesmo tempo de espaço para a troca entre diferentes
conhecimentos da área através de minicursos, palestras e debates entre
professores da UFF e de outras instituições. Aimée Scnheider, aluna de
doutorado e membra da Comissão organizadora do evento, falou sobre os desafios do planejamento e contou a mudança
que o grupo teve que passar para manter o evento. “Ao longo de suas
edições, o perfil da Comissão da SHUFF foi se diversificando para além de suas
raízes da graduação; hoje, ela está distribuída também entre mestrandos e
doutorandos, mas sem nunca ter a participação direta de professores da
Universidade”.
Márcia Motta, professora do curso de História participante
do evento, aprova a iniciativa dos alunos, mas lamenta a falta de valorização e
apoio deste tipo de atividade por parte de alguns gestores. “Sou uma entusiasta
da iniciativa, porque os alunos sempre têm algo a nos ensinar. É impressionante
o profissionalismo deles, em coordenar um evento deste porte com poucos
recursos e de enorme retorno acadêmico, com a presença de alguns dos principais
historiadores do país. Mas, infelizmente, por ser um evento organizado por
alunos, vemos poucos chefes de departamentos e diretores do Instituto
participando”, afirma.
Ao longo do evento, os dias foram divididos em eixos
temáticos, dando continuidade à linha inaugurada pela 1ª Semana de História da
UFF, em 2012, que separa os dias em Teoria, História Antiga, Medieval, Moderna
e Contemporânea. Neles, as oficinas, que possuem caráter prático, tiveram seus
temas correspondentes aos recortes de cada dia, e as mesas de comunicação
abriram espaço para a apresentação de trabalhos diversos por parte de alunos,
tendo em cada mesa a coordenação de um discente ou professor orientador. Além
disso, a cada edição (anual) os organizadores elegem uma personalidade da área
para ser homenageada. Este ano a escolhida foi Maria Yedda Linhares, ex-professora
da instituição e nome importante do campo historiográfico brasileiro. “A
homenagem à Maria Yedda Linhares se justifica também pelo seu papel crucial na
implementação do Programa de Pós-Graduação em História da UFF”, destaca Schneider.
Professores na Mesa do dia 27/08 –
“Visões da Modernidade: linguagens e contextos”
Outro tema que inevitavelmente não ficou de fora das
discussões da 6ª Semana de História da UFF foi o recente incêndio ocorrido no
Museu Nacional, no Rio de Janeiro, em que mais de 90% do acervo foram perdidos
em meio às chamas. Aimée conta que, em virtude da proximidade do fato com a
do evento, a programação formal não pôde ser mudada, mas que o ocorrido foi
lembrado por muitos convidados. “Seu impacto não passou despercebido na tônica
do evento, sendo abordado, sobretudo, nas sessões de comunicação das mesas de
debate voltadas para o estudo do patrimônio histórico”.
Márcia Motta revela conhecer o problema de perto, em função
de sua amizade com pessoas que administram importantes museus do país, o que,
segundo ela, serve para reafirmar sua postura cética diante do atual cenário.
“Tenho um enorme orgulho de ser amiga do diretor do Museu Imperial, o Maurício
Vicente, e de acompanhar o trabalho de preservação daquele tesouro. O mesmo
pode ser dito em relação a outro amigo, Paulo Knauss, que hoje dirige o Museu
Histórico. Vejo e sei que pessoas como eles “enxugam gelo”, apesar da enorme
experiência que possuem”.
Ela ainda classifica o tema como desanimador, porque, em
suas palavras, o ocorrido desperta muita tristeza, sendo desconcertante e
destruidor. “Na prática, há poucos recursos, nenhum investimento e a sociedade
não reconhece a importância do patrimônio público. Os museus, os arquivos e
centros de investigação são vistos – em geral – como fontes de despesa, e não
lugares de construção de nossa memória nacional”, explica.
Maria Yedda Linhares:
uma trajetória de luta em prol da educação pública
Nascida em Fortaleza, em 1921, Maria Yedda
teve sua história de vida se confundindo com a de um dos períodos mais
conturbados e difíceis do país - a ditadura militar. Entre 1964 e 1966 ela
respondeu a sete inquéritos políticos militares (IPMs), sendo presa três vezes
e aposentada compulsoriamente pelo regime. Após a soltura, Yedda exilou-se na
França e só retornou ao Brasil em 1974. Na sua volta, começou a lecionar na
Universidade Federal Fluminense e, nos anos 1983-1987 e 1991-1994, atuou como
Secretária de Educação do Rio de Janeiro nos governos de Leonel Brizola,
participando, ao lado de Darcy Ribeiro, da construção de mais de 750 escolas no
estado.
Márcia Motta, que esteve na mesa de abertura da Semana de
História da UFF, afirma que a homenagem não poderia ser mais justa. "Maria
Yedda é um símbolo de uma historiadora engajada e preocupada em encontrar
soluções para os problemas de um país que tanto amava. Os que a conheceram
devem sentir falta de sua coragem como mulher, intelectual e como
política." Aimée ainda aproveita para complementar a fala da docente.
"Sua própria atuação política junto a Leonel Brizola e Darcy Ribeiro como
Secretária Estadual de Educação do Rio de Janeiro na implantação do projeto dos
Centros Integrados de Educação Pública (CIEPs) traduz esse esforço na luta por
uma educação pública de qualidade" conclui.
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