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O limite de um comentário: opinião ou crime?

 Avanço das discussões sobre "liberdade de expressão" nas redes põem em xeque valores de tolerância e respeito na sociedade                            

Por: Lohayne Borges

Imagem: Captura de tela - Lohayne Borges
                                               

                                   


Comentários sobre aparência, postagens preconceituosas, discursos de ódio, ameaças e intolerância disfarçados de opinião têm se tornado cada vez mais presentes dentro das redes sociais. Usando perfis anônimos ou não, os "haters" podem direcionar seus ataques tanto a celebridades quanto a usuários comuns, com algum tipo de visibilidade. Embora seja garantida pelo artigo quinto da Constituição Federal, a livre manifestação do pensamento não significa passe-livre para aqueles que espalham suas "opiniões" maldosas na internet.


Para a  psicóloga Jessyca Antunes D. Ferreira, com certeza os  comentários são capazes de impactar de forma negativa o psicológico das pessoas. Ela considera que o ambiente em rede reproduz a lógica contemporânea de esvaziamento das relações. A necessidade de emitir opinião e se posicionar sobre tudo acabando gerando essa onda de comentários sem cuidado, sem afeto e sem ética.


“As redes sociais apenas ilustram e intensificam essa maneira de existir na modernidade. A exigência da vida perfeita que estimula, responsabiliza e culpabiliza cada vez mais o sujeito, este que é agora tomado como dono de seu próprio destino, construtor de sua felicidade, mas, também de seus fracassos”. 


Conhecida nas redes pelo perfil @pretademais, a criadora de conteúdo Preta conta que excluiu comentários com receio das reações que iriam gerar. Ela considera que o limite da opinião é o respeito e acrescentou que quando um comentário desrespeita ou ofende física ou emocionalmente alguém "não é um comentário válido.” 

Apesar de não ser algo frequente, lembra que já sofreu ataques de haters. Segundo ela, a experiência foi "terrível", porém nunca precisou tomar decisões mais sérias, mesmo contando com apoio jurídico. Para evitar este tipo de situação, tem procurado tomar mais cuidado em suas falas. 


Imagem: Captura de Tela Twitter/Instagram
 

Apesar de não saber afirmar com certeza se existe uma rede em que a exposição aos haters seja maior que as outras, considera que o Twitter tem um potencial maior de alcance, o que daria margem para ataques.


“ O Twitter abre bastante as coisas que você posta e o conteúdo que você posta. Tem um alcance muito maior, acaba chegando em outros públicos e pessoas que não têm proximidade com o seu conteúdo, não tem afinidade com aquilo que você fala, com aquilo que você pensa e isso gera um pouco de conflitos. Mas eu não sei não se tem uma rede mais específica. Eu sei que em todas as redes se vê muito pessoas fazendo comentários maldosos ou ouve algum influenciador ou criador de conteúdo tendo essas dificuldades.”


Haters e saúde mental 


Entender os possíveis motivos que levam as pessoas a comentar de forma maldosas, não é uma tarefa fácil. A psicóloga Jessyca lembra que a produção de ódio não se inaugurou na internet, mas sem dúvida lá é o lugar de legitimação. "Que direito nós temos sobre a vida do outro?" Ela apontou como possível motivo de ataque a defesa de pontos vista, além da possibilidade de se "esconder" e "não ser responsabilizado" pelos atos nas redes.



Imagem: Captura de Tela - reprodução da Internet

Um caso que repercutiu recentemente, após uma reportagem do RJTV, foi o da psicóloga Roberta Massot, que recebeu ataques racistas contra sua filha de dois anos após a publicação  de um vídeo em seu perfil no instagram. Uma mulher que se identifica como pedagoga em seu perfil, mandou uma mensagem via direct para mãe da criança dizendo “Ela tem uma raiz de cabelo um pouco dura, né?” se referindo ao cabelo da menina de 2 anos. Roberta respondeu  que a  “raiz é crespa” corrigindo a mulher, que insistiu: “ A raiz dela é dura mesmo. Não é crespa não”. A mãe da criança levou o ocorrido para a justiça e o caso foi registrado como injúria por preconceito.


Dentre os muitos casos envolvendo famosos, o da cantora Luísa Sonza foi sem dúvidas também chamou atenção. Sofrendo constantes ataques após o fim de seu casamento, que se intensificaram com a morte do filho de seu ex-marido. A cantora precisou deixar as redes e o país por um tempo na tentativa de evitar os haters e preservar a sua saúde mental, antes disso, ela chegou a gravar stories aos prantos: “Pelo amor de Deus parem com essa história, ninguém aguenta mais gente, ninguém aguenta mais. Pelo amor de Deus”, pedia Luísa. Outro caso grave foi o do Lucas Santos, filho da ex-vocalista da banda Magníficos, Walkyria Santos, que após publicação de um vídeo em seus Tik Tok recebeu uma série de comentários maldosos, o que, segundo a mãe do adolescente, o levou a tirar a própria vida. 


Setembro Amarelo X Redes 

O Setembro amarelo é o mês da valorização da vida e dentro das redes sociais as campanhas sempre ganham força, mas o importante é que as mudanças de atitudes não aconteçam somente no mês de setembro. Jessyca argumenta que a depressão e a ansiedade já estão em nosso cotidiano e podem ter as redes como mais um lugar para ilustrar a forma que nos relacionamos coletivamente, o que pode ser um fator determinante para o desenvolvimento dessas doenças.


"As questões de saúde mental que permeiam, atravessam e habitam nos nossos corpos estão sempre ligadas ao campo social e devem ser pensadas e cuidadas também desta maneira, cuidando não só do sujeito, mas, também do mundo".


Para ela a campanha não deve ser apenas sobre amar as pessoas na internet e sim sobre respeito e valorização da vida, que as pessoas possam existir de formas diferentes e sobreviver na vida e nas redes, sem o sentimento de perseguição e pressão que podem ser gerados por comentários maldosos.

Tipos de Ataque  e punições


Xingamentos, gordofobia, homofobia, xenofobia, racismo, injúria e alguns outros temas estão presentes em muitos comentários na internet diariamente. Os ataques, muitas vezes, acontecem por meio de perfis anônimos, uma vez que os autores acreditam que não podem ser identificados.


Alguns crimes cometidos e podem sofrer ação penal são:


  • Calúnia (previsto no artigo 138 do Código Penal) ,difamação (previsto no artigo 139 do Código Penal), injúria (previsto no artigo 140 do Código Penal) todos  presentes na Lei Nº 2.848.

  •  Racismo previsto na  Lei nº 7.716 .

  • Homofobia

  • Ameaça  prevista no artigo 147 do Código Penal


A Lei do Stalking 

Em março de 2021 foi sancionada a lei LEI Nº 14.132, conhecida como a Lei do Stalking que pune a perseguição com pena de reclusão, de seis meses a dois anos, e multa.

“Art. 147-A. Perseguir alguém, reiteradamente e por qualquer meio, ameaçando-lhe a integridade física ou psicológica, restringindo-lhe a capacidade de locomoção ou, de qualquer forma, invadindo ou perturbando sua esfera de liberdade ou privacidade.”

Quando os comentários se encaixam como crime é importante e possível registrar ocorrência em qualquer delegacia incluindo o formato online. 




Imagem: Captura de Tela- Lohayne Borges


Posturas das Plataformas:


 As próprias redes sociais vem atualizando suas políticas de uso e oferecem recursos como a opção de denunciar o comentário/publicação e bloquear o perfil de quem incomoda.


 O Twitter


Dentro das Regras do Twitter  existe a Política contra a Propagação de ódio. Após um a denuncia de um conteúdo nocivo, a plataforma fará uma análise e tomará medidas contra um indivíduo ou grupo de pessoas. Com a comprovação de violação das regras  pode ser solicitado a remoção do conteúdo, gerar restrição de tweetar por um tempo ou até mesmo a suspensão permanente da conta.


O Instagram 


O Instagram também já atualizou suas  Regras sobre o discurso de ódio, de acordo com o comunicado entre julho e setembro de 2020 foram tomadas medidas contra 6,5 milhões de itens contendo discurso de ódio na plataforma. A plataforma ainda anunciou novas punições 

 “anunciamos que tomaremos medidas ainda mais duras quando descobrirmos que as pessoas estão violando as nossas regras em mensagens diretas. Atualmente, quando alguém envia mensagens diretas que violam as nossas regras, proibimos essa pessoa de enviar mais mensagens por um determinado período. Agora, se uma pessoa continuar enviando mensagens que violam as nossas regras, a conta dela será desativada. Também desativaremos novas contas criadas para contornar as nossas restrições de mensagens. Continuaremos desativando contas que acreditarmos que são criadas exclusivamente para enviar mensagens abusivas”.




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